quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Entendendo Parmênides

.. e tentando defender Heráclito.

“Em uma assembléia, um argumentador defende a opinião de que a guerra é boa para nós; enquanto outro defende a opinião contrária. Vencerá aquele que melhor souber persuadir a opinião alheira, e não a melhor idéia.”

            Pode até ser que não existe “não ser”; que as coisas e os seres sejam essencialmente imutáveis e que a mobilidade não passe de mera ilusão.  Mas, ainda que seja no campo da opinião, os homens precisam achar que são capazes de evoluir e de se modificarem.
            Durante vinte e quatro horas dos seus dias e de trezentos e sessenta e cinco dias dos seus anos, o homem está olhando para o futuro acreditando que tudo vai ser diferente, que nada do que ele faz é em vão e que ele só caminha porque vai chegar a algum lugar. Segundo Parmênides em 99% do seu cotidiano o homem vive no plano da opinião, do “achismo”, e não procura conhecer a verdade dos fatos. Mas espera aí?! Já imaginou se pelo menos 50% das pessoas passassem o dia a refletir, tentando encontrar fatos concretos e percebessem que tudo é estável, que tudo não passa de opinião, que a vida é um círculo sem fim, e que ela não vai chegar a lugar algum?! É, de fato, é melhor ficar no plano dos conceitos leigos, nos quais compreende-se que tudo passa, que tudo flui.
            Eu acordo todos os dias achando que mudei, sentindo saudade de algumas coisas que fui e não sou mais, e tendo a certeza de que sou um banco de dados, que vem recebendo informações, acumulando conteúdos e formando opiniões ao longo desses 21 anos. Se eu estou feliz de estar onde estou?! Claro! Porque tenho a certeza que continuo caminhando e que amanhã não serei mais a mesma e nem meus caminhos serão mais os mesmos; afinal de contas, defendendo Heráclito, uma mesma pessoa não pode cruzar a mesma rua duas vezes. 
 - Marina

pra combinar com meu mobilismo :


quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Curiosidade

(...) E ali estava um fato incontestável para ela, que olhava a diante como se tivesse descoberto o mundo: não eram os caminhos que se cruzavam, era ele que insistia em andar sobre seus caminhos, feito alguém que não sabe para onde vai, mas sente-se seguro ao apoiar-se em alguma coisa.

significado de coisa - tudo o que existe; todo ser inanimado, animado, real ou aparente.
anagrama de coisa -  cisão.  significado: separação, rompimento.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Por que amamos alguém?

   




Um dia li em algum lugar a explicação de porque amamos alguém, o texto não era detalhado, mas falava algo sobre honestidade, caráter e bom gosto. Dizia que não amamos alguém por ser educado ou por ser fã do Caetano Veloso, que esse tipo de coisa é apenas referência, que na verdade o que nos leva a amar é o mistério e o fascínio que alguém nos provoca.
Concordei em parte. É claro que precisamos nos sentir fascinados, e atraídos por algum tipo de mistério, mas há coisas que são muito mais significantes e que não podem ser vistas apenas como referências, dentre elas há duas que me encantam: a coragem e a inteligência, não necessariamente nesta respectiva ordem de importância.

Quando falo de coragem, que isso fique bem claro, não me refiro a um super-homem, com super poderes que aparece sempre que precisamos, luta contra os piores malfeitores e nos livra dos piores apuros. Quando falo de coragem quero dizer sobre aqueles que ‘não tem medo’, que encaram a vida como uma grande aventura única, que acreditam nos seus sonhos, que são fortes para lutar e para conquistar tudo aquilo que desejam.  Admiro aqueles que sabem o que querem e que acreditam que querer é poder, não havendo nada no mundo que possa impedi-los de chegar onde anseiam.

Tomando a liberdade de parafrasear Vinícius de Moraes eu diria: os muito burros que me perdoem, mas a inteligência é fundamental. Quem nunca ouviu dizer que inteligência é afrodisíaco? Não há nada mais charmoso na face da Terra do que uma pessoa que saiba falar de qualquer coisa e que tenha opinião (sem impô-la, claro) sobre diversos assuntos. Não sei se é porque eu tenho verdadeira 'birra' de ficar inventando argumentos e 'esticando papo' pra estabelecer um diálogo legal, que, pra mim, não há nada mais confortável que um homem que saiba conversar, que saiba ser fluente e deixar as coisas rolarem.
Agradar as mulheres não é difícil, pelo contrário, tudo o que as mulheres querem são homens inteligentes, que saibam ser divertidos com frequência, sérios quando conveniente, sistemáticos quase nunca, discretos quase sempre e brutos quando necessário.

Mudando um pouco de foco, há algo que é extremamente relevante e que eu não posso deixar de mencionar. Eu já ouvi dizer que toda mulher sabe se tem alguma probabilidade do relacionamento dar certo, a partir do primeiro beijo. Pode até ser que isso funcione ou que tenha algum fundamento lógico, afinal ninguém quer continuar saindo com alguém cujo beijo é ruim, mas o que realmente importa pra mim, até mesmo antes do primeiro contato bucal, é a compatibilidade do abraço. Nunca tive um relacionamento que durasse se o abraço fosse incomodo ou desconfortável.
Uma vez saí com um garoto que me enforcava toda vez que ia me abraçar. Ele me abraçava de gancho, com apenas um braço; desisti dele antes mesmo de beijá-lo. Em outra ocasião saí com garoto que era bem alto e que me abraçava pelos ombros apertando minhas costelas e eu tinha que ficar mirando o teto para conseguir respirar. Este foi só mais um que tentou me matar, nosso relacionamento durou pouco mais de três semanas. Quando meus relacionamentos duraram de verdade foi quando num fechar de braços eu me senti em casa, foi quando cada canto do meu corpo encontrou uma brecha para se acomodar no corpo de lá; foi quando eu senti que o mundo podia desabar lá fora que eu estaria protegida ali.

Sinceramente, acho que não sei por que amamos alguém. Vai ver existem coisas que são apenas referências, ou vai ver o que realmente importa é o jogo de mistérios. Definitivamente, eu não sou a melhor pessoa para falar de amor, muito menos pra definir este sentimento pra mim. Mas referências ou não, sou simples assim como aquilo que me encanta: coragem, inteligência e um bom par de braços.

- Marina 

Fragmento II

' (...) Verdes e nauseados, eles não saberiam exprimir. A casa simbolizava alguma coisa que eles jamais poderiam alcançar, mesmo com toda uma vida  de procura de expressão. Procurar expressão, por uma vida inteira que fosse, seria em si um divertimento, amargo e perplexo, mas divertimento, e seria uma divergência que pouco a pouco os afastaria da perigosa verdade - e os salvaria. Logo eles que, na desesperada aspereza de sobreviver, já tinham inventado para eles mesmos um futuro: ambos iam ser escritores, e com uma determinação tão obstinada como se exprimir a alma a suprimisse enfim. E se não suprimisse, seria um modo de só saber que se mente na solidão do próprio coração. ' 
 (Clarice Lispector - Felicidade Clandestina; conto: A Mensagem  -  p.130)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Projeção


Naquele dia ela acordou desejando freneticamente que alguém munido de uma supra inteligência tivesse desenvolvido uma tecnologia que a possibilitasse voltar no tempo. Levantou-se apressada, ligou a TV, assistiu o noticiário, e nada. Voltou ao seu quarto, abriu uma das gavetas da cômoda na qual guardava seus diários, escolheu um deles aleatoriamente, abriu uma página e leu alguns trechos. Fechou os olhos apertando ligeiramente as pálpebras esperando que alguma coisa acontecesse, mas nada aconteceu. Então, reabriu os olhos e se viu ali, uma mulher estúpida de vinte e poucos anos, sentada em uma cama pequena de um quarto pequeno, de uma casa pequena em uma rua pequena, de uma cidade pequena de um mundo gigante. Sentiu que era apenas uma mulher estúpida querendo voltar a ser criança.
“Que saudade de mim, de quando tinha nove anos” - pensou. “Quando eu tinha esta idade, sabia exatamente o que estava fazendo e tinha certeza de onde eu iria chegar. Quando eu tinha nove anos, me sentia forte e madura, havia um brilho estranho no meu olhar e um sorriso entusiasmado no meu rosto. Hoje sou apática e fraca, minhas pernas mal suportam o peso do meu copo e há  qualquer coisa com o peso de um mundo instalado nas minhas costas. Hoje eu não faço a menor idéia de pra onde estou indo e tenho sérias dúvidas se vou conseguir chegar em algum lugar.” - Depois de um ou dois minutos olhando pros retratos que ficavam sobre a escrivaninha, ela colocou a mão sobre os olhos e esperou que acontecesse. Logo, logo vieram os soluços e a respiração ficou ofegante, várias lágrimas despencaram e molharam os dedos que tentavam esconder aquele rosto gélido e sofrido de uma criança que acordara de repente e percebera que havia um universo lá fora, com pessoas e seres estranhos que exigiam dela algo muito além do que ela estava preparada para oferecer. Quis se esconder. Debaixo da cama talvez fosse o melhor lugar. Entretanto, apenas se virou, deitou-se e ficou a admirar o teto por alguns segundos.  
Sentiu falta  de quando o seu maior medo era o escuro.  Sentiu saudade de quando os desafios eram nadar até a grade da lagoa ou atravessar a piscinona do clube. Sentiu saudade do tempo que  não tinha responsabilidades e de quando ficava a tarde inteira de pernas pro ar vendo Pica-pau, Tom e Jarry, Pateta e Max, Mickey e Donald, comendo fandangos,  e aquilo não lhe trazia uma imensa sensação de culpa.  Sentiu saudade de pensar ‘no que seria quando crescesse’ e desejou, por um momento, esquecer que havia crescido.
Sentiu saudades de quando as pessoas confiavam nela, de quando era uma das primeiras da turma, certamente premiada no final do ano pelas boas notas. Sentiu saudade de quando a cidade era pequena demais, e de quando ela acreditava que tinha asas e que poderia voar. Sentiu saudade do tempo em que lhe denominavam ‘a artista’, ‘a cheia de talentos e a de futuro brilhante’. Sentiu saudade dos palcos, da criatividade e dos sorrisos. Sentiu falta dos amigos que deixara lá atrás, em algum lugar. Sentiu falta do que era e repugnou aquilo que havia se tornado.
Ergueu-se lentamente, como se fosse uma rocha e alguém estivesse a guinchá-la. Foi até o banheiro, jogou um pouco de água no rosto e viu sua imagem refletida no espelho.  “Cadê a arte que estava em mim?”  - pensou. “O gato comeu ou o tempo levou? Não me reconheço mais quando me olho no espelho. Ques olhos sem brilho são estes que me fitam? Onde foi parar aquela criança que acreditava que tudo era possível?” - Magicamente a imagem se mexeu e foi se dissolvendo paulatinamente até que ela percebeu que alguém com um sorriso tímido a admirava. Era uma criança de nove ou dez anos, pele clara, cabelos cacheados que escorriam pelos ombros, um ar de autoestima elevado e confiança. A imagem mais uma vez se dissolveu, e aos poucos, com certa dificuldade, outra foi se formando. Desta vez uma senhora de uns sessenta anos, cabelos curtos e mal pintados, com um olhar triste e frustrado, olhou para ela. Quando a percebeu ali, a mulher cerrou os olhos e havia raiva neles, como se culpassem a jovem de alguma coisa. Ela tentou dizer “sinto muito”, “não foi minha culpa”, mas a mulher se fora, a imagem havia sumido, e tudo que ela viu diante de si foram seus olhos cheios de medo - sentimento este, aliás, era o único que sabia sentir há dias – novamente no espelho.

 - Marina


Pra combinar:


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Fragmento

'(...)Porque eu me imaginava mais forte. Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria - e não o que é. É porque ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque eu me ofendo à toa. é porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa. É porque eu sou muito possessiva e então me foi perguntado com alguma ironia se eu também queria o rato pra mim.' 
( Clarice Lispector - Felicidade Clandestina; conto: Perdoando Deus -  p.43,44 )