Borboletas

' Você diz que ama a chuva, mas você abre seu guarda-chuva quando chove. Você diz que ama o sol, mas você procura um ponto de sombra quando o sol brilha. Você diz que ama o vento, mas você fecha as janelas quando o vento sopra. É por isso que eu tenho medo. Você também diz que me ama.' 

- desconhecido

(...)

- me ama? como assim me ama?

Ela cerrou os olhos e se inclinou para os dedos remexentes em suas mãos. Por longos anos ela esperou por aquelas palavras. ‘Talvez seja ele’ pensou. E depois seus pensamentos vagaram para uma imensidão de incertezas.

Na vida nunca se sabe quando se encontra a pessoa certa. Quem dera elas viessem com um pisca alerta, acendente depois do primeiro contato, dizendo: sou eu.  E subseqüente continuassem piscando letreiros: prometo ficar aqui pra sempre e prometo tentar fazer dar certo. Mas a única coisa que a gente sabe é que tem hora que o coração acende e inquieta, as pernas tremem e surgem borboletas valsantes no nosso estomago.

Ela o olhou nos olhos em busca de verdades. Eles eram negros como a noite e brilhavam por causa dos reflexos das luzes da rua. Tinha alguma coisa diferente ali, ela percebeu. Aquele não era mais o mesmo garoto que ela conhecera meses atrás. Seus sorrisos continuavam os mesmos, embora ela tivesse descoberto mais dois, mas os olhos... esses sempre foram um mistério pra ela.

‘Ele disse que me ama’ pensou mais uma vez. Teve vontade de se atirar nos seus braços, beijá-lo demoradamente e gritar que o amava intensamente. Mas teve medo. Ela sabia que os olhos não eram os mesmos.. eram doces, sinceros e cheios de luz, porém, ela conhecia os sorrisos, conhecia cada alegria, cada dor e cada mentira que eles podiam encobrir. E teve medo.. teve muito medo.

- tem medo de mim? – ele, por fim, rompeu o silêncio,  falando com autoridade e certeza de quem a conhecia há anos.

- não! – ela disse sem vacilar. Sua mente girou, seu coração deu duas batidas e parou. O beijo foi longo e meticuloso. Ele sabia como ela gostava; cada mão, cada braço, cada mordida, cada frequência. O beijo parou, o mundo continuou rodando, até que ela finalmente conseguiu abrir os olhos: ‘Ele é lindo’ disse pra si mesma.

            Ele passou a mão lentamente sobre seus cabelos para melhor lhe enxergar o rosto, mas ela o desviou. Era complicado dividir o coração com aqueles sentimentos: paixão e medo; amor e desconfiança.

            Ela fechou os olhos mais uma vez e segurou as lágrimas. Estava chegando a hora, ela sentiu.

           

Caminharam lentamente pela rua escura e ela tentou prolongar o máximo que pudesse aquele momento. Finalmente se despediram. Um simples até breve e uma pequena jura de amor eterno. Um beijo doce e curto seguido por um abraço aconchegante e sincero.

            Como é lindo o amor, pensavam os passantes. Mas só eles sabiam, talvez ela soubesse mais, o que acontecia ali. Era o fim. Porque ela não acreditaria nunca, ainda que desejasse com todas as forças.

            ‘ Ele me ama’ pensou ‘ele me ama, com sete sorrisos e dois olhos brilhantes, ele me ama!’ e depois riu da própria inocência. Seguiu-se então o beijo de despedida... Ela sentiu seu coração se partir e gritar para que ela não tomasse aquela decisão. Mas estava feito.

      
            Ele se foi e ela sentiu-se livre (uma sensação estranha diante do fim), uma mistura de alívio e vazio que durou alguns instantes até que ela finalmente percebeu a verdade: embora não fossem mais um do outro, continuariam se pertencendo de alguma forma.

            Aceitou a situação. Também foi embora. Vagando pela noite escura ela fez uma prece silenciosa : desejou que alguém, diferente, vindo de algum lugar sem despedidas, algum dia chegasse e fizesse bailar de novo as borboletas.

            - Marina